Enzima altera sensibilidade à dor

Alteração em gene da enzima ALDH2 aumentou a sensibilidade de camundongos a episódios de dor

A ativação de uma enzima conhecida como aldeído desidrogenase-2 (ALDH2), essencial para o metabolismo do álcool, pode também determinar o quanto somos sensíveis à dor, segundo um estudo publicado nesta quarta-feira, 27, na capa da revista Science Translational Medicine. Nele, um grupo internacional de pesquisadores, coordenados pela biomédica Vanessa Zambelli, do Laboratório Especial de Dor e Sinalização (LEDS) do Instituto Butantan, desenvolveu um modelo animal no qual foi induzido em camundongos uma mutação específica no gene dessa enzima, responsável por eliminar do corpo os chamados aldeídos circulantes — moléculas tóxicas produzidas pelas células sob estresse que podem danificar algumas proteínas e até causar câncer.
Há muito se sabe que os portadores dessa mutação são mais suscetíveis aos efeitos do álcool, que ao ser metabolizado libera grandes quantidades de aldeídos. Em estudos recentes, pesquisadores verificaram que a ALDH2 é pouco eficaz em parte dos orientais. Estima-se que 36% da população do leste da Ásia tenha essa mutação, apresentando, como consequência, baixa tolerância ao álcool. Basta uma cerveja, por exemplo, para essas pessoas ficarem com o rosto vermelho. Estudos recentes também verificaram que os orientais do leste asiático são menos tolerantes à dor: pelo que se sabe agora, não é uma mera coincidência.
Foi essa mesma mutação que Vanessa e colaboradores induziram em um grupo de camundongos, reduzindo em 60% a atividade da ALDH2. Em seguida, eles injetaram uma substância que causava inflamação e verificaram que estes camundongos, comparados aos do grupo controle, eram mais sensíveis à dor causada pela inflamação. Logo depois trataram os mesmos camundongos com a molécula Alda-1, capaz de reestabelecer a atividade da ALDH2. Os pesquisadores constataram que a sensibilidade dos camundongos à dor voltou a diminuir.
De acordo com Vanessa, a Alda-1 mostrou ter um importante potencial farmacológico para controle da dor porque, diferentemente da maioria dos anti-inflamatórios, não apresenta risco cardiovascular. Essa molécula foi identificada por um grupo de pesquisadores da Universidade Stanford, nos Estados Unidos — ao qual a pesquisadora se juntou em seu pós-doutorado — em colaboração com pesquisadores da Universidade de São Paulo (USP) e demonstrou, em ensaios pré-clínicos, potencial para o tratamento da insuficiência cardíaca, entre outras doenças.
Em um estudo publicado em 2011 na mesma Science Translational Medicine, o grupo de Stanford demonstrou um benefício adicional: ao ativar a enzima ALDH2 nas células cardíacas, a Alda-1 protegia o coração após um infarto. “Apesar de muito ainda precisar ser feito, os resultados sugerem que a ativação da ALHD2 com a Alda-1 pode reduzir a dor sem causar efeitos adversos ou dependência”, explica Vanessa. Essa é a diferença em relação às principais drogas hoje usadas para diminuir a dor, como a morfina.
Projetos

1. Papel da aldeído desidrogenase 2 e do 4-hidroxinonenal na dor (nº 2012/05035-4);Modalidade Auxílio Pesquisa – Regular; Pesquisadora responsável Yara Cury (Instituto Butantan); Investimento R$ R$ 155.669,93 (FAPESP).
2. Papel da aldeído desidrogenase 2 e do 4-hidroxinonenal na dor (nº 2011/08873-8); Modalidade Bolsa no País – Regular – Pós-Doutorado; Pesquisadora responsável Yara Cury (Instituto Butantan); Bolsista Vanessa Olzon Zambelli (Instituto Butantan); Investimento R$ 113.364,88 (FAPESP).

Artigo científico

ZAMBELLI, V. O. et al. Aldehyde dehydrogenase-2 regulates nociception in  rodent models of acute inflammatory painScience Translational Medicine. v. 6, n. 251, p. 1-11. ago. 2014.



Fonte: Revista Pesquisa Fapesp - RODRIGO DE OLIVEIRA ANDRADE | Edição Online 15:02 27 de agosto de 2014



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